domingo, 30 de setembro de 2007

Gigantes

Um barulho de multidão pareceu me despertar. Abri os olhos devagar, estava ofegante, respirava com dificuldade. O ar estava empoeirado e uma neblina de fumaça confundia minha visão, meu corpo teimava em querer dormir, exausto. Tão logo o cérebro conseguiu processar as imagens e perceber o que ocorria, uma dor ensurdecedora tomou conta do meu peito. A respiração virou um exercício desgastante. A dor pulsava e irradiava para todo o corpo. Reparei, então, que estava deitado no chão da rua. O asfalto de tão quente já não queimava mais, sentia frio. As feridas abertas nas costas ardiam, mas a dor no peito...

- Aaargh!

Coloquei a mão direita no núcleo da dor e percebi um buraco... Muito sangue, droga! Algumas pessoas corriam ao som de tiros e gritos. Um embaralhar de pernas que me desorientava. Já não compreendia bem os sons para distinguir se vinham em minha direção ou fugiam. No asfalto uma sombra ameaçou se aproximar e começou a me cobrir. Eram monges.

Por cinco segundos permaneci assustado, mas a dor que me esmagava no asfalto trazia a perfeita noção de que eu fazia parte daquele cenário. Aqueles jovens de veste grená passavam por mim e me olhavam, seus olhos confortavam meu coração e minha dor pareceu fazê-los maiores.

Eles eram gigantes agora. Minhas pálpebras pesaram e um sono irresistível invadiu minha alma. Na sombra entre o último suspiro e o fechar dos olhos vi os tanques recuarem... Um silêncio...

segunda-feira, 24 de setembro de 2007

Concentração!

Um dia desses me ocorreu pensamento muito louco. Quer dizer, pensamento não, sentimento... Estava em casa em mais uma sessão de estudos quando embaixo da mesa de vidro escuro, na qual apoiava meus livros e cadernos comecei a perceber uma movimentação frenética para lá e para cá.

Era noite e para economizar na conta de luz utilizava uma pequena luminária para conseguir enxergar o que lia. Essa situação dava ao ambiente um toque de penumbra e a impressão que eu tinha era a de que o silêncio aumentava quanto menos luz houvesse.

Aquela movimentação inquietante embaixo da mesa atrapalhava meus estudos, volta e meia surpreendia meus pensamentos tentando advinhar do que se tratava ou ainda se era alucinação da minha mente conturbada com tanta teoria.

A situação acabou se agravando. Quando percebia a movimentação do objeto não identificado bem ao fundo do meu raio de visão eu virava a cabeça em sua direção e... Nada. Já havia sumido. Pronto, o estudo já estava esbulhado! Não ia descansar enquanto não entendesse o que acontecia: estava eu maluco ou existia sim algo se movendo enlouquecidamente?

Esperei uns trinta segundos quando, enfim, se apresentou um cidadão menor que a ponta da minha caneta Bic, com duas asas transparentes batendo igual a um idiota na porcaria do vidro da mesa!

Era um daqueles bichinhos de luz, o maluco devia estar achando que o vidro não existia e voava na direção da luz quando de repente... POF!

Ha, ha! Coitado. Fico imaginando seus pensamentos confusos, sem entender o que ocorre: 'por que diabos não consigo alcançar a luz? Ela está ali, estou indo em direção a ela... Bem até aqui tudo certo... Só que... POF!' Ha, ha! Muito burro!

Zuei mesmo! Pô... Fica atrapalhando minha concentração. O bichinho estava fazendo pior do que o chato da biblioteca. Com este pelo menos é só fazer um XIIIIU que ele pára de atrapalhar. Se bem que muitas vezes o mané, solidário que só, passa a falar baixinho, sussurrando... Putz... que raiva, não, não, prefiro o...

- POF!
- Oh, maluco! No caderno não! Sai, Sai, vamos rapaz...

O retardado do bichinho deu de cara no caderno, daquele tipo com espiral.

- Vamos seu doido! Você está pedindo um peteleco... Ha, ha! Olha isso...

Ele estava entrando e saindo daqueles furos nas folhas do caderno por onde passa o arame do espiral. O que esse cidadão está pensando da vida? Que a vida é uma folha de papel? Imagine se eu fosse um bichinho desses... acham que ficaria perdendo tempo?

- Vai ler um livro, evolui! Por isso é que está aí, nessa escala da evolução, dando com a cara no vidro sem entender o que acontece! Atrapalhando a vida de quem está tentando melhorar...

Quer saber, vou tirá-lo daqui, fazê-lo voar... Assoprei o bicho para longe. Caramba, ele deve ter caído lá naquele canto escuro. Ah! Ele vai sobreviver!

- Vai seu prego... acende a outra luz. Daqui a pouco enche daqueles bichinhos de luz e aí não conseguirá se concentrar...

- Tá.. tá bom.